O fantasma da inflação ameaça novamente a população brasileira. Será que estamos no início de um novo processo, no qual haverá um aumento recorrente dos índices de preços que gradualmente destroem o poder de compra dos rendimentos familiares? Afinal, o Índice Geral de Preços de Mercado (IGPM) acumulado nos últimos doze meses já está em 24,52%, emitindo um sinal de alerta para os demais índices de preços aos consumidores nos próximos meses.
Não é uma tarefa fácil elaborar previsões econômicas. Basicamente, os economistas se dividem em dois grupos quanto a tais previsões. De um lado, muitos economistas admitem que os resultados de eventos econômicos a serem observados em uma data futura são a sombra estatística das informações de mercado do passado e do presente. O futuro não é, portanto, incerto. As previsões sobre eventos futuros como a inflação podem ter alguma probabilidade de risco, mas são previsíveis com segurança a partir de expectativas racionais sobre as tendências observadas nos dados estatísticos existentes.
Por outro lado, outros economistas destacam que a verdadeira incerteza ocorre quando não se pode especificar um conjunto completo das perspectivas de uma ação futura e sua eventual ocorrência. Como dizia John Hicks, Prêmio Nobel de Economia de 1972: “Os modelos econômicos deveriam ser construídos onde as pessoas no modelo não sabem o que vai acontecer e sabem que não sabem o que vai acontecer. Como na história!” O futuro é incerto e não pode ser previsível com confiança analisando apenas os dados do mercado.
Examinemos esse dilema no caso da provável inflação de 2021 no Brasil. Uma versão mais otimista: a pandemia provocou uma desestruturação da capacidade de oferta de diferentes cadeias produtivas, ao mesmo tempo em que o Governo Federal, ao distribuir ampla e corretamente os auxílios emergenciais para milhões de brasileiros, criou um choque de demanda que estimulou a elevação dos preços em setores de oferta inelástica no curto prazo por causa do ciclo de produção (alimentos, por exemplo) e da escassez de insumos. Basta uma questão de tempo para as taxas de inflação se acomodarem, pois não haverá realimentação de preços e salários uma vez que a desindexação da economia avançou profundamente. Tudo bem no ano que vem.
Uma versão menos otimista: como o Governo Federal não tem conseguido, por razões políticas e ideológicas, fazer progredir as reformas institucionais nem formular uma estratégia de crescimento sustentado, a economia deverá permanecer estagnada após o renivelamento da demanda e da produção pós-pandemia e com o déficit potencial muito elevado, criando um ambiente propício para a sobrevivência da inflação em patamar alto, ainda que sob controle. Estaríamos caminhando para uma nova experiência de estagflação em 2021? Tudo incerto no ano que vem.
O que fazer diante de cenários alternativos sobre a economia brasileira? Dois conselhos de Peter Drucker: “A melhor maneira de prever o futuro é criá-lo” e, como é preciso renovar ideias e repensar a atual política econômica, “Se você quer algo novo, você precisa parar de fazer algo velho”.
Paulo R. Haddad é professor emérito da UFMG. Foi Ministro do Planejamento e da Fazenda no Governo Itamar Franco.
Texto originalmente publicado no jornal O Tempo em 03/12/20.
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